Maria Antônia (1932- )

Maria Antônia (1932- )
  Ma-Antonia 40 anos
c.1955. Eu tinha uns quatorze ou quinze anos quando ouvi minha irmã recitar alguns trechos do poema Dactilografia, de Fernando Pessoa. Vira e volta ela sempre tentava me provocar, queria que eu ouvisse isso ou aquilo. Certo dia, estava passando pela sala e, quando ela passou pelo “tique-taque estalado da máquina de escrever”, me deu um “tique”, seguido de um “taque”, comecei a ler Pessoa e não parei mais. Naquele momento estava estabelecida a relação mestre – discípulo entre mim e minha irmã. A partir de então, e sempre, quando ela contava de livros ou cinema, eu escutava.
Após ter descoberto o autor de Em Busca do Tempo Perdido, lá pelo fim dos anos 1950, foi a Paris em 1960 buscar Proust.  Achou outra coisa… melhor – o Carlos. Por sua influência, data desse período minha leitura de A Prisioneira. Nunca me esqueci da poderosa e longa narrativa sobre o estado de vigília. Aquele momento que não é ainda, mas é quase (ver neste site Marcel Proust)
Ainda adolescente ela me apresentou a Jacques Prévert (Spectacle e Paroles), Paul Géraldy (Toi e Mois) e Arthur Rimbau, este com o poema Voyelles , e Marcel Proust. De Proust, li aguns trechos de A Prisioneira e No Caminho de Swan, ambos em tradução. Também insistira para que eu lesse L’Imoraliste, de André Gide, L'Étranger, de Albert Camus, e L'Être et le Neant, de Paul Sartre. Peguei em Sartre mais velho, a vol d’oiseau.
Em 1989, recebi uma longa carta em Bissau, onde ela dizia ter lido “a mais longa declaração de amor por telefone”. Era Raimundo Silva para Maria Sara – os dois protagonistas de o Cerco de Lisboa, de José Saramago. Foi fácil encontrar o livro na ex-colônia portuguesa.
Em junho de 2010 Maria Antônia nos apresentou à escritora portuguesa Inês Pedrosa (Fazes-me falta e Em tuas mãos). Minha mulher Ligia leu primeiro e insistiu. Que descoberta! Na mesma época, em São Paulo, leu-me um trecho da escritora libanesa Nada Moghaizel, C’est para la Poesie, do livro Images Écrites, onde a autora fala do aprendizado da língua durante a infância. Um aprendizado que de dá involuntariamente através da poesia. “…Nós compreendíamos os poetas antes mesmo de compreender a língua”. Era a voz “tão bela” da “maman” consolando a criança. O texto me tocou tanto com …a beleza das palavras é tão imensa que elas contém até mesmo aquilo que desconhecemos.
Novembro de 2010. Estou iniciando seu outro presente, Un amour de Swann, (décima segunda parte do Du côté de chez Swann), romance que recebeu o “Grand Prix des meilleurs romans du demi-siècle” (1950). Estarei em boa companhia por algum tempo.

Mas, suas descobertas, que eu pego emprestadas, não param. Para citar a última (novembro de 2010), ela chegou de Portugal com um dito para mim inédito: a saudação lisboeta “– Até sempre”. Depois disso, eu nunca mais falei “– Até logo”.
Janeiro de 2011, e o ano principia com seu presente supresa:Œuvres, de Rimbaud (Ed. Garnier, 1998). Mais uma boa companhia.
Outro dia Maria Antônia me ligou para revelar um novo achado. Estava ela no consultório, a porta se abriu e um paciente, ao se despedir do médico, exclamou:   “– Até de repente” . Era um português.

28/01/2011

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1 comentários:

Luis Alfredo Moutinho da Costa disse...

Para Maria Antônia.
Quando vc ler, escreva algo aqui.